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PROGRAMA DE INDIO

01/10/2011

8 ª bienal do mercosul

Eugenio Dittborn

José Roca, curador

Uma das mostras centrais da 8ª Bienal do Mercosul é a exposição do chileno Eugenio Dittborn (Santiago do Chile, 1943), artista de referência na América Latina. A obra de Dittborn baseou-se na transterritorialidade, no nomadismo e nas estratégias para subverter as fronteiras e penetrar os centros sem se deixar neutralizar por eles. Dittborn trabalha desde 1983 em suas Pinturas Aeropostais, obras que são dobradas para serem enviadas em um envelope postal. Cada envelope possui inscrito o itinerário da viagem, as cidades para onde a obra foi enviada e os lugares em que foi exposta e é exibido ao lado da pintura aeropostal desdobrada, já que isso é a sua condição de possibilidade.

Pode-se abordar o trabalho de Dittborn desde pelo menos três pontos de vista: estratégico, material e iconográfico.

A estratégia das Pinturas Aeropostais reside no fato destas viajarem como cartas e se desdobrarem como pinturas em seu destino. Mas não permanecem ali: uma pintura aeropostal sempre está de passagem. É por isso que Dittborn fala que a aeropostalidade de suas pinturas reside nas dobras. Elas que são sua possibilidade e também a testemunha da operação artística que teve lugar. As outras testemunhas da viagem são os envelopes, realizados em cartão e especialmente acondicionados para conter as pinturas dobradas, levam e trazem, em cada caso, além dos dados do destino, uma série de textos alusivos à pintura que contém. A exibição dos envelopes provê informações das viagens, tal qual bússolas, assim como algumas chaves textuais para a interpretação da pintura que contêm.

O segundo ponto de abordagem é a matéria. As primeiras Pinturas Aeropostais tinham como suporte o papel kraft, ou papel de embalagem, mas, a partir de 1986, Dittborn começou a usar entretela sintética não tecida, um material entre papel e tecido. Em meados dos anos 1990, Dittborn passou a empregar loneta, conhecida comercialmente como duck fabric, material que utiliza até hoje. As técnicas utilizadas variam segundo cada obra, mas, no geral, pode-se dizer que se resumem aos seguintes procedimentos: tingir, alinhavar, costurar, bordar, imprimir, desenhar, enxertar e dobrar. As pinturas nas obras de Dittborn são tingimentos, derramados com o suporte disposto de maneira horizontal, deixando que o líquido pigmentado se estenda e embeba, impregne e penetre os suportes, estabelecendo manchas de cor que se espalham nas fibras do têxtil por absorção. Nesse campo pictórico se distribuem os diferentes elementos iconográficos, impressos diretamente sobre a tela ou outro material (usualmente telas muito finas de algodão ou cetim), que logo são recortados e alinhavados com linha à obra.

A iconografia usada por Dittborn é muito variada, mas, no geral, visita certos temas: o acidente de viagem e a interrupção do trajeto – o naufrágio, a catástrofe aérea; o envoltório como veículo de transição entre dois territórios – o envelope, o berço, a mortalha; o rosto humano; os manuais escolares de desenho; a publicidade arcaica; as caricaturas e outras formas de desenho (o de crianças ou esquizofrênicos), nos quais não haja uma plena consciência e o desenho seja feito quase que de maneira involuntária; as gravuras históricas, a notícia jornalística, a matéria policial; a imagem de pintores posando como pintores. Os elementos citados anteriormente se combinam de diversas formas. Como se tratassem de letras, sílabas ou palavras, Dittborn reutiliza esses elementos como abreviaturas hieroglíficas ou ideogramas de interpretação variável. Entre as características formais da operação combinatória estão a fragmentação, a repetição, o diálogo entre elementos similares e a tensão entre elementos dissímeis.

Esta mostra abre em Porto Alegre durante a semana de inauguração da Bienal; uma semana depois, uma das Pinturas Aeropostais será enviada, junto com um ativador pedagógico e um material didático, a três centros culturais em outras cidades do Rio Grande do Sul, ressaltando o caráter literalmente viageiro da obra de Dittborn e a afirmação de que a experiência de uma pintura aeropostal é “ver entre duas viagens”. Dittborn viajou às cidades de Pelotas, Caxias do Sul e Bagé e integrou em uma nova obra textos e imagens destinadas a cada um desses lugares. Essa nova obra se desmembrará em três partes, que viajarão respectivamente aos lugares que inspiraram sua composição iconográfica.

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